Deixar de usar óculos pode fazer aumentar o grau da lente?
Dos cinco sentidos do corpo humano, a visão é o que mais estimula a nossa vida, pois nos torna capazes de enxergarmos tudo ao nosso redor. É claro que os demais sentidos têm, cada qual, importância na nossa jornada, mas é pelos olhos que quatro quintos de todas as informações recebidas pelo cérebro chegam até nós. Complexa, mas frágil, a visão pode ficar comprometida com o passar do tempo —ou ainda antes disso—, por fatores genéticos, ambientais ou cuidados inadequados. Muitos dos problemas oculares, porém, podem ser corrigidos com o uso de óculos de grau. Contudo, algumas pessoas que precisam de óculos ficam na dúvida se a não utilização pode fazer com que o grau da lente aumente. Mas será que essa questão tem fundamento? (Continua após a publicidade).
De acordo com os médicos oftalmologistas, apesar de ser uma afirmação corrente no meio leigo, ela não procede. O grau nem aumenta ou diminui com o não uso dos óculos. De fato, a maioria das pessoas acredita que o aumento do grau dos óculos acontece por não usá-los corretamente ou que o uso correto de óculos vai fazer com que o grau diminua, mas não é o que acontece. De forma geral, usar óculos não é um tratamento, mas, sim, um auxílio para que possamos enxergar bem e confortavelmente apesar do grau que possuímos. Uma exceção é com relação às crianças menores de sete anos, nas quais os óculos podem, sim, ser um tratamento para que tenham um adequado desenvolvimento visual. Alguns oftalmologistas ressaltam a importância do uso de óculos, mas lembram também que a prática em nada leva à diminuição ou aumento do grau. Quem tem um grau que deveria ser corrigido, ou que não está usando os óculos adequadamente, isso pode fazer com que se tenha dor de cabeça, mal-estar, dificuldade de enxergar, mas não vai aumentar o grau.
Aumento do grau
Se deixar de usar regularmente os óculos não aumenta o grau, o que então pode levar à essa escalada? De acordo com os oftalmologistas, um dos fatores que aumentam o grau das lentes são as modificações ocorridas na estrutura do olho. Essas alterações podem acontecer na curvatura da córnea, na refração do cristalino ou no tamanho do globo ocular. O fator familiar também tem relevante papel no aumento do grau, apontam. Conforme os médicos, o que pode estar relacionado ao aumento do grau é a genética da pessoa e, ainda, o uso excessivo de telas, como computador, celular e smartphones, assim como a diminuição das atividades ao ar livre.
O hábito do uso de telas está bem relacionado ao aumento da miopia, mais recentemente essa constatação foi descrita por pesquisadores como causa determinante para o aumento desse distúrbio na população, atrelado à diminuição da exposição ao sol e das atividades ao ar livre. O fato é que o uso frequente das novas tecnologias é uma atividade da vida moderna que leva as pessoas a utilizarem mais a visão para perto. Essa realidade impacta, sobretudo, crianças e adolescentes, ocasionando uma epidemia de 'miopia'. Temos atualmente uma quantidade de jovens e crianças com miopia muito maior do que as gerações anteriores. O uso prolongado da visão para perto e a falta de atividades ao ar livre é um estimulo para o desenvolvimento da miopia nessas faixas etárias, é como se o olho entendesse que 'se está usando muito a visão para perto, é melhor que ele seja míope'.
Os professores recomendam ainda que o primeiro exame de medida da acuidade visual em crianças seja feito entre três e quatro anos de vida. Nessas idades já é possível medir o quanto a criança está enxergando, usando tabelas apropriadas. Em caso de se detectar alguma anormalidade estaremos dentro do período de desenvolvimento visual da criança, que vai do nascimento até por volta dos sete anos de idade, tornando o tratamento, se possível, mais adequado.
Uso de óculos
Em um ser humano saudável, a visão é plena até pouco antes da meia idade. Assim, o mecanismo de acomodação é perdido gradativamente com o passar do tempo e o avanço da idade, sendo que os efeitos dessa perda são sentidos por volta dos 40 anos, período em que a visão para perto começa a ficar comprometida. É a chamada presbiopia, que faz com que pessoas que nunca usaram óculos comecem a ter de usá-los para enxergar de perto; já para aquelas que usam óculos para longe é necessário recorrer aos chamados bifocais ou multifocais, uma vez que o grau que corrige a visão para longe não é mais suficiente para corrigir a visão para perto.
É comum as pessoas pensarem que os efeitos da presbiopia foram causados pelo mau uso da visão ou dos óculos, ou por terem forçado demais os olhos. Isso não é verdade. A presbiopia é um processo natural de envelhecimento dos olhos. A necessidade de usar óculos depende do grau, é claro, mas principalmente do tipo de ametropia (hipermetropia, miopia ou astigmatismo), da idade da pessoa e da atividade. Dessa forma, não é só o grau que determina seu uso.
As pessoas que usam óculos também se questionam da necessidade do uso contínuo ou se é possível utilizar alternadamente. Quem usa óculos não precisa, necessariamente, usar o tempo todo: existe um grupo de pessoas que usa óculos e depende dele, tanto para longe quanto para perto e essas pessoas deveriam usar os óculos sempre, mas também existem pessoas que só precisam de óculos para perto, então elas podem usá-los somente para leitura ou na utilização do computador ou do celular. Na verdade, o uso dos óculos vai depender da necessidade que o paciente tem para enxergar ou do desconforto e cansaço visual pela falta das lentes. Em alguns casos, contudo, o médico pode recomendar o uso contínuo. Quando não estiverem satisfazendo do ponto de vista de conforto ou de visão, as lentes devem ser trocadas. No entanto, recomendamos que independente da questão dos óculos, o exame periódico no oftalmologista seja realizado.
Livre de óculos
A dependência dos óculos é maior quanto maior for o grau e o tipo de problema, além da idade. Pequenos graus de miopia já causam grande dificuldade e míopes tendem a ser dependentes dos óculos. Para hipermetropia, o olho dispõe de um mecanismo compensatório natural que chamamos de acomodação. Quanto mais jovem for a pessoa, mais eficiente será esse mecanismo. Adolescentes, por exemplo, com graus não muito elevados de hipermetropia, conseguem ficar sem óculos, enquanto adultos, principalmente após os 40 anos e com o mesmo grau, podem ser totalmente dependentes deles. Em relação ao astigmatismo a acomodação consegue resolver parcialmente o problema.
O uso da acomodação para compensar graus de hipermetropia ou astigmatismo podem, no entanto, causar sintomas como dores de cabeça, cansaço e sonolência, principalmente em escolares e adultos jovens. Estes pacientes vão necessitar dos óculos nos momentos de maior esforço visual. Não é possível, naturalmente, parar de usar óculos, não há fórmulas ou receita, não há comprovação científica. Uma pessoa que precisa usar óculos deve usá-los para ter melhor visão e evitar riscos de acidentes, como quedas, por não enxergar bem. Hoje em dia, no entanto, existem técnicas para deixar de usar óculos, como as cirurgias; na retrativa, por exemplo, o cirurgião usa um laser para compensar e corrigir o grau na córnea do paciente. Uma outra técnica é a cirurgia da catarata, para pacientes com mais de 50 anos. Eles têm disponíveis lentes de alta tecnologia para serem inseridas dentro do olho, no lugar da catarata, são lentes com tecnologias agregadas para dar mais independência dos óculos ao paciente, podendo, muitas vezes, ficar livre deles depois da cirurgia.
Dependendo do grau e segundo orientação médica pode não ser necessário usá-los o tempo todo. É bastante frequente, principalmente em crianças hipermetropes, haver uma regressão espontânea do grau, não havendo mais necessidade do uso de lentes corretoras. As lentes de contato e as cirurgias refrativas são uma boa alternativa para quem não deseja usar óculos.
Dr. Marcus Vinicius de O. Pinto é médico oftalmologista e escreve semanalmente nesta coluna.
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